Campo Grande (MS), Segunda-feira, 13 de Outubro de 2025

Mortes se repetem apesar do tabu e preconceito com suicídio e depressão

14/04/2015

16:00

CMS


Mulher amea�ou se jogar da torre de ilumina��o do est�dio Moren�o, em setembro do ano passado,
mas foi salva pelos bombeiros. (Foto:Arquivo Campo Grande News)

A morte do advogado Rafael Zarza Ribas, 29 anos, que caiu do 27� andar do hotel Bahamas no domingo, e da estudante de Matem�tica da Uniderp-Anhanguera, Cristiane Valdenice Carvalho, 28, que sofreu uma queda do terceiro andar de um bloco da institui��o, na noite desta segunda-feira (13) gerou uma s�rie de coment�rios e movimentou as redes sociais, incluindo grupos de WhatsApp, trazendo � tona um assunto que ainda � tabu na sociedade: a depress�o.

No caso do advogado, os pr�prios familiares revelaram que ele passava por tratamento h� seis meses devido ao fim de um relacionamento amoroso. J� quanto a estudante, o fato de nenhum amigo ou familiar ter feito qualquer men��o sobre o estado emocional de Cristiane, n�o impediu os depoimentos e coment�rios sobre uma poss�vel depress�o, incluindo grupos de WhatsApp.

No facebook do Campo Grande News, os seguidores se mostraram chocados e n�o pouparam coment�rios sobre a import�ncia de tratar e discutir a doen�a, que avan�a de forma silenciosa a cada ano, segundo especialistas.

Para se ter uma ideia do quanto � urgente a necessidade de rever a forma de lidar com a doen�a, basta observar os dados do Mapa da viol�ncia realizado no Brasil ano passado, apontando que o n�mero de suic�dios aumentou 10,1% em Mato Grosso do Sul de 157, em 2012, para 173 casos em 2013. O Estado apresenta o quarto maior �ndice de casos por habitante. Na maioria das situa��es, a morte � reflexo de depress�o, doen�a que ajuda a lotar postos da Capital e representa 70% dos atendimentos ambulatoriais das unidades de sa�de mental.

O Estado s� fica atr�s de Minas Gerais (9,1 para cada grupo de 100 mil), de Santa Catarina (8,4) e do Rio Grande do Sul (8,2). Com 7.087 suic�dios em 2013, a taxa nacional � de 3,5 mortes para cada 100 mil habitantes. Dados da OMS (Organiza��o Mundial de Sa�de) atestam que, em m�dia, s�o registrados 27 suic�dios no pa�s, o que refor�a a necessidade imediata de pol�ticas p�blicas mais efetivas no sentido de identificar e tratar as v�timas da depress�o.

H� 15 anos desenvolvendo projetos de pesquisa no Hospital Universit�rio da Capital e trabalhando com v�timas da doen�a considerada o mal do s�culo, o professor Edilson Reis lamenta o fato de a doen�a ser discutida apenas quando surge uma sequ�ncia de casos. Ele critica a forma como a sociedade e apropria imprensa aborda a quest�o. �Criou-se um mito de que ningu�m pode falar sobre isso. � um erro porque a falta de informa��o s� piora o quadro do depressivo�, afirma.

Ele diz que independente da fam�lia da v�tima aceitar o fato, � preciso suscitar o tema como forma de alerta. �N�s temos campanhas anuais voltadas para todo tipo de doen�a porque n�o a��es voltadas para a depress�o?�, questiona. Acostumado a viajar pelo pa�s divulgado seus trabalhos, o professor, que � refer�ncia no assunto no Estado, destaca que observa um crescimento dos casos que caem na obscuridade devido a falta de informa��o.

�Quando a pessoa est� fragilizada, ela tem que entender que est� doente e precisa buscar ajuda. N�o � uma fraqueza moral, � uma doen�a�, ressalta. O professor diz que em 97% dos casos de suic�dio a v�tima possu�a algum dist�rbio emocional. Desse total, a maioria � depress�o, seguida de s�ndrome do p�nico. �N�o podemos ter vergonha de falar sobre o problema�, alerta.

No HU ele lidera um trabalho de preven��o da doen�a, al�m de ir em escolas, empresas e entidades ministrar palestras e responder d�vidas. Este ano ele organiza o nono semin�rio sobre depress�o e afirma que o v�u do preconceito que encobre a doen�a n�o foi retirado totalmente da sociedade, fato que acaba contribuindo com a nega��o do mal. Com isso, a v�tima, que j� est� fragilizada, n�o sente seguran�a em conversar com a fam�lia, amigos e t�o pouco procurar ajuda m�dica.

�Quando a pessoa se atira de uma janela � um pedido de socorro. Ela queria mostrar que n�o suportava mais viver aquela dor e n�o soube lidar com ela�, explica. 

Foi para evitar uma atitude extrema que a dona-de-casa Angelina Alves da Costa se encheu de coragem e buscou ajuda logo que percebeu a chegada da S�ndrome do P�nico, doen�a que fez parte de sua rotina durante 25 anos e teve origem no estresse que Angelina sentia quando morava em S�o Paulo. Ao mudar para Campo Grande, ela buscou ajuda e acabou se encontrando na homeopatia.

Mas at� chegar ao ponto de manter a controle sob controle foi uma longa caminhada. �N�o sa�a de casa sozinha para nada, tinha medo de tudo. Nem visitar minha filha eu ia�, lembra. Para a dona-de-casa, encarar o mal � dif�cil, mas � o primeiro passo para solucionar o problema. E ela faz um alerta sobre a necessidade de manter vigil�ncia para evitar reca�das ou o desenvolvimento de outra doen�a, como aconteceu h� um ano meio, quando ela come�ou a sentir os primeiros sinais da depress�o. �Cheguei a sentir dores f�sicas�, conta.

Ap�s uma nova empreitada, ela vem superando a cada dia o problema. �O dia que me olhei no espelho e n�o me reconheci, decidi investir na minha sa�de e cuidar mais de mim�, ensina. A psic�loga Abigail Saling enfatiza que as pessoas, de um modo geral, n�o entendem a dificuldade do doente em buscar ajuda, e n�o percebe o quanto � dif�cil simplesmente reconhecer que � v�tima da doen�a. �Como � uma doen�a que gera piadas e brincadeiras, as pessoas sentem vergonha de se expor e acabam achando que o tratamento psicol�gico n�o vai resolver�, diz.

A psic�loga diz que outra situa��o, igualmente grave, tamb�m ocorre com os depressivos quando ele busca apoio apenas nas medica��es e n�o reconhece a import�ncia de uma terapia. �S�o tratamentos que precisam ser casados, sen�o voc� n�o trata a doen�a em sua totalidade�, ressalta.

Sintomas e mundo virtual - Tanto Edilson Reis quanto a psic�loga Abigail Saling destacam que � poss�vel identificar alguns ind�cios de que a pessoa est� depressiva. A necessidade de se isolar, de abandonar atividades que fazia rotineiramente e apatia s�o alguns desses sinais.

Quando a pessoa era comunicativa e passa a demonstrar uma tristeza e para de conversar com a fam�lia e amigos, fica mais f�cil identificar, segundo Reis. Mesmo os leigos, segundo ele, conseguem notar as diferen�as no comportamento da pessoa, principalmente se ela faz parte do seu conv�vio di�rio.

Para Abigail a identifica��o pode se tornar mais complicada caso a pessoa continue trabalhando ou desenvolvendo suas tarefas normalmente, no entanto, sempre h� algum sinal, mesmo que sutil. �Ela at� pode trabalhar, mas vai apresentar algum problema, como falta de produtividade�, explica.

De acordo com os especialistas, a intensa atividade que existe no mundo virtual hoje em dia pode ajudar a diagnosticar esses sintomas. �Todo mundo posta no facebook como est� se sentindo e muitas delas deixam pistas de que n�o est�o bem�, diz a psic�loga. Por�m, segundo Abigail, o mundo virtual tem um outro lado que pode contribuir com a depress�o. �Temos amigos virtuais, mas nem sempre o presencial, disposto a ouvir a dor do outro�, afirma.


Igreja cat�lica faz novena para combater a depress�o
(Foto: Arquivo)

F� - Paralelo ao tratamento m�dico e terapias, os profissionais apoiam a ado��o de uma atividade religiosa, mas o professor Dilson Reis, que tamb�m � capel�o no HU, afirma que � fundamental n�o abandonar o tratamento e n�o encarar a doen�a apenas como um mal espiritual. �Antes demais nada a depress�o � uma doen�a do f�sico, que necessita tratamento como qualquer outra�, atesta.

E � justamente este cuidado que o padre Dirson Gon�alves, da par�quia Perp�tuo Socorro tem durante as novenas que realiza todas as quartas-feiras. Ele explica que a cada ciclo de nove semanas aborda um tema e, por �inspira��o�, como ele prefere dizer, escolheu este m�s para falar sobre depress�o. �Perguntei quem j� teve ou conhecia algu�m que sofre da doen�a e todos levantaram a m�o�, conta.

O padre concorda com os profissionais da sa�de de que o assunto � tabu, por isso a dificuldade em lidar com a quest�o na pr�pria casa. �Procuramos fazer nosso trabalho dando apoio espiritual, mas ainda falta informa��o e as pessoas sentem vergonha porque escutam dizer que � frescura�, diz.

A f� tamb�m ajudou a dona-de-casa Angelina Costa. Ela frequenta o Gaepe (Grupo de Apoio Espiritual �s Pessoas Enlutadas), que presta auxilio com base na doutrina esp�rita, por�m � um grupo aberto e n�o faz distin��o de religi�es. Mesmo sabendo que o trabalho do grupo � voltado �s pessoas que sofreram perdas familiares, � l� que ela vem conseguindo superar a depress�o ap�s a filha ter ido morar em outra cidade. �Sei que perdi apenas a proximidade com minha filha, mas l� n�o tem preconceito. Conversamos sobre tantos assuntos e isso tem me ajudado�, destaca.

O Gaepe, que no final da tarde desta ter�a-feira far� uma corrente de ora��o pelas v�timas de suic�dio, tamb�m orienta seus frequentadores a buscarem ajuda m�dica.


Fonte: campograndenews
Por: Fl�via Lima
Link Original: http://www.campograndenews.com.br/cidades/mortes-se-repetem-apesar-do-tabu-e-preconceito-com-suicidio-e-depressao




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