EDUCAÇÃO E DESIGUALDADE
Educação deve ser direito e não herança de classe, defende especialista
André Lázaro critica naturalização das desigualdades e alerta para impactos da exclusão social e racial no sistema educacional brasileiro
01/10/2025
08:00
AGÊNCIA BRASIL
REDAÇÃO
© Tânia Rêgo
A superação das desigualdades na educação brasileira passa, segundo o especialista André Lázaro, pelo reconhecimento de que o país ainda trata a educação como um privilégio de classe, e não como um direito fundamental.
Diretor de Políticas Públicas da Fundação Santillana, Lázaro aponta que a estrutura social do Brasil ainda reproduz exclusão e desigualdade, com forte impacto sobre o desempenho escolar de crianças e jovens, especialmente os mais pobres, negros e moradores de áreas rurais.
“Lamentavelmente, a educação ainda é uma herança de classe, mas ela tem que ser um direito de todos”, afirmou, citando a frase de Joaquim Nabuco para ilustrar a persistência da desigualdade: “Um país que viveu 300 anos com escravidão vai custar muito admitir a igualdade de todos”.
Dados revelam abismo educacional entre classes sociais
De acordo com o Anuário Brasileiro da Educação Básica 2025, apenas 2,4% dos jovens do 3º ano do ensino médio pertencentes aos 20% mais pobres tiveram aprendizagem adequada em matemática e língua portuguesa, enquanto entre os 20% mais ricos esse índice foi de 16,3%. Em escolas públicas, o percentual é de apenas 4,5%, contrastando com 28% nas escolas privadas.
Ainda assim, Lázaro ressalta que o problema não se limita à rede pública: “Mesmo entre os mais ricos e nas escolas privadas, o nível de aprendizagem é insuficiente. Isso mostra que há uma crise nacional na educação, que atinge toda a estrutura”.
Desigualdades regionais e exclusão no campo
Outro ponto crítico é a educação no meio rural. Entre 2014 e 2024, 16 mil escolas municipais foram fechadas no campo, o que Lázaro considera uma estratégia que expulsa as famílias da zona rural, promovendo a concentração fundiária e dificultando a permanência da juventude no campo.
“O filho chega à juventude e os pais querem o melhor para ele. Sem escola, eles são forçados a ir para a cidade e vender a terra. A agricultura familiar perde, e a concentração de terras aumenta”, alerta.
O especialista também destaca que a população negra continua vivendo uma situação de desvantagem educacional inaceitável, e que políticas públicas devem combater essa exclusão com urgência.
Caminhos para a equidade
Como exemplo de iniciativas bem-sucedidas, Lázaro menciona as políticas afirmativas no ensino superior, como as cotas, que abriram caminho para que jovens negros e pobres chegassem à universidade pública e, hoje, atuem como intelectuais influentes no debate nacional.
André Lázaro defende que a educação deixe de ser privilégio e se consolide como direito real para todos os brasileiros (Foto: Arquivo pessoal)
“O acesso à universidade por meio das cotas ampliou a diversidade do pensamento e trouxe novas vozes para a esfera pública. Isso precisa ser valorizado”, afirmou.
Avanços e desafios
Apesar das desigualdades, o especialista reconhece avanços, como o aumento no acesso à pré-escola e ao ensino fundamental. Segundo o anuário, 95% das crianças ingressam na pré-escola, tanto na rede pública quanto na privada. Em 2024, 97,6% dos jovens de 11 a 14 anos estavam matriculados nos anos finais do ensino fundamental, e 82,8% dos adolescentes de 15 a 17 anos estavam no ensino médio – um aumento de quase 10 pontos percentuais desde 2014.
Mesmo assim, problemas estruturais permanecem, como o subfinanciamento da educação, a desvalorização da carreira docente e a alta rotatividade nas redes estaduais. “Hoje, 49% dos professores das redes estaduais têm contratos temporários. Como construir espírito de equipe com metade do corpo docente trocado a cada ano?”, questiona.
Padronização e diversidade
Lázaro ainda critica a visão padronizadora da educação imposta por algumas políticas nacionais. Para ele, a igualdade precisa reconhecer a diversidade, e não ignorá-la. “O Brasil enfrenta um dilema educacional: em nome da igualdade, estamos gerando padronização. A BNCC [Base Nacional Comum Curricular] acabou impondo isso, quando o correto seria usar a diversidade como ativo educacional.”
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