Aumento de mosca causa morte do rebanho e produtores est�o desesperados
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Usina de Odebrecht em Nova Alvorada do Sul (Divulga��o/Odebrecht) |
Pecuaristas e pequenos produtores de leite do munic�pio sul-mato-grossense de Nova Alvorada do Sul est�o desesperados com o surto da mosca da cana, que causa a morte dos animais. A suspeita sobre a origem do problema leva o nome de uma gigante presente nas manchetes do Pa�s todo, a Odebrecht. Uma das 3 usinas sucroalcooleiras que a Odebrecht Agroindustrial tem em Mato Grosso do Sul � acusada de despejar um res�duo poluente, a vinha�a, que em excesso, fermenta em contato com material org�nico, e faz com que as moscas proliferem.
Milton Barbosa � um dos produtores atingidos. Ele atua em quest�es ambientais junto ao Sindicato Rural do munic�pio, e trava uma batalha contra a empresa h� 7 anos. Milton calcula um preju�zo de R$ 350 mil. Das 3 fazendas que possui, uma fica a 4 km da Usina e foi o local mais afetado pelo aumento das moscas. O produtor critica a Famasul (Federa��o de agricultura e pecu�ria de Mato Grosso do Sul) que afirma ter atrapalhado um processo movido pelo Sindicato contra a empresa.
�Ela � um caso s�rio, faz 7 anos que j� est� essa briga. 2011 que explodiu. A gente tinha um processo, mas, misteriosamente alguns diretores junto com a Famasul retiraram esse processo. Fizeram uma assembleia com os produtores, trouxeram s� produtor de cana. Em 2012 come�aram a aparecer as moscas, falaram que era do est�bulo, que n�o era deles, contrataram a Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecu�ria] para fazer pesquisa, que est� dizendo que � culpa realmente das Usinas�, explicou.
Milton afirma que hoje �compra leite de caixinha para beber�. Um projeto que regulamenta o res�duo produzido pelas Usinas foi aprovado na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, movido pela Comiss�o de Meio Ambiente, mas o produtor acredita que a normativa n�o resolve a quest�o.
�Virou nada, aprovaram uma lei totalmente nova, sem fun��o, sem nada. Esse inqu�rito est� rolando desde 2012 e at� agora nada. N�s �ramos 38 produtores de leite aqui, hoje acho que tem uns 3. Eu produzia mais de mil litros por dia, hoje eu compro leite de caixinha pra beber, tem produtor de gado que perdeu mais�, comentou.
Pequeno produtor, Ademilson Rosa Pinheiro, 49, teve que vender as poucas vacas que tinha e agora trabalha com uma carreta para tentar sobreviver. �Estamos sofrendo, est� complicado. Agora mesmo est�o atacando de um jeito que at� os cachorros est�o loucos. Elas come�aram quando come�ou a jogar aquela vinha�a. Para a Usina, para de jogar a vinha�a, a� para as moscas acabam. Volta a jogar a vinha�a, volta as moscas de novo�, esclarece.
�Mas esse ano, vou falar pra voc�, veio de um jeito, elas ferroam a gente, � do�do. Meu irm�o tem uma vaca l� que est� demais, acho que n�o vai aguentar n�o. O nosso � s�tio. N�is tudo produzia, paremo tudo, parei faz uns 3 anos [sic]. Eu agora tenho bem pouquinho, tinha umas cento e poucas cabe�as de vaca. Eu tenho umas 30 cabe�as agora, tive que vender, n�o tem condi��es. E agora at� o meu irm�o vai vender tamb�m, porque n�o tem condi��es�, complementou.
MPE investiga
Em 2012, motivada pelas den�ncias dos produtores o MPE-MS (Minist�rio P�blico Estadual) instaurou inqu�rito para investigar o suposto dano ambiental provocado pela Usina. Questionado, o MPE afirmou, por meio da assessoria de comunica��o, que o promotor de Justi�a �est� aguardando a per�cia que est� sendo realizada pelo Departamento Especial de Apoio �s Atividades de Execu��o (DAEX)�.
Com 68 anos, Ruth Nair Barbosa viu 68 vacas morrerem na propriedade ap�s serem picadas pela mosca. Ela explica que os pequenos produtores e os camponeses que vivem do leite que produzem foram os mais atingidos. Ela estima ter perdido mais de R$ 300 mil.
�Vendi tudo, acabei com tudo porque morreu 68 vacas. Eu tinha 755, vendi tudo. Foi em 2011 que come�o a morrer, tenho b.o de delegacia, da Iagro, ia morrendo eu ia l� e fazia ocorr�ncia. Eu acho que comecei a perder 2010 e 2011. A vaca deitava, eu corria, trazia soro pra fazer essa vaca deitar. A vaca abortava, ela n�o tem for�a pra botar o bezerrinho pra fora. Umas novilhas novas, de primeira cria, 40 que come�ou a dar cria, morreu as 40. S�bado e domingo, voc� n�o tem no��o como estava. Eu estava com uma bezerrinha novinha dormindo sozinha no galp�o�, relatou.
�Arrendei inteirinha a minha fazenda. Eu estou com 2 vacas que sobrou tamb�m. E vai morrer tamb�m. Eu parei com tudo, porque depois que derrubaram nosso processo no sindicato eu fiquei desanimada�, complementou.
Pesquisa comprova dano das Usinas
Realizada como tese de Doutorado na UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) a pesquisa intitulada �Din�mica populacional e surtos de stomoxys calcitrans em usina sucroalcooleira e propriedades pecu�rias adjacentes� foi realizada por Taciany Ferreira de Souza Dominghetti e comprova o aumento da mosca da cana � cujo nome cient�fico � Stomoxys calcitrans -, nos per�odos de safra da cana de a��car.
A pesquisadora analisou a Usina da Odebrecht em Nova Alvorada do Sul de janeiro de 2013 a dezembro de 2015, e monitorou o local por 21 dias, entre agosto e setembro de 2014. Uma das propriedades contempladas pelo estudo � a fazenda de Milton Barbosa. A pesquisa apontou aumento das popula��es da mosca entre os meses de abril/maio a dezembro (safra) e redu��o da popula��o entre janeiro a mar�o/abril (entressafra). Assim a tese introduz o assunto:
-Na regi�o Centro-Oeste, especialmente em Mato Grosso do Sul, a recente ocorr�ncia de surtos por S. calcitrans e as graves perdas econ�micas em rebanhos de gado de corte criados extensivamente t�m sido associadas com a crescente implanta��o das ind�strias sucroalcooleiras. A capacidade de reprodu��o e multiplica��o desta praga em subprodutos org�nicos gerados pela usina acarretam explos�es populacionais e, consequentemente, graves problemas para ambos os setores envolvidos.
�Neste contexto, fica evidente o efeito da atividade (agr�cola e industrial) de produ��o da cana-de-a��car sobre a din�mica de S. calcitrans, principalmente quando se observa os picos populacionais no per�odo mais frio do ano, quando as condi��es clim�ticas s�o menos favor�veis para a mosca-dos-est�bulos. Assim, no per�odo da safra, ocorre aumento significativo na abund�ncia de S. calcitrans, pois utilizam a enorme oferta de subprodutos org�nicos gerados pela usina como locais de reprodu��o�, apontou a tese.
Assembleia deve investigar novamente
Membro da Comiss�o de meio ambiente da Assembleia, o deputado Felipe Orro (PDT) afirma que os produtores trouxeram o assunto � tona novamente esta semana, o que deve motivar nova apura��o.
�Primeiro n�s vamos levantar o que efetivamente est� acontecendo, vamos pedir laudos de laborat�rio. O ex-deputado M�rcio Monteiro, Petila, n�s fomos l� pra ver in loco, tinha empossamento [sic]. A empresa veio, fizemos um projeto de lei, o governo mandou outro projeto e a� acalmou, e da� volta. N�s queremos � que a Usina gere emprego e que respeite quest�es ambientais. Eles me passaram uma situa��o muito delicada�, comentou.
A Famasul declarou, por meio da assessoria de comunica��o, que n�o tem nenhuma a��o judicial relacionada ao assunto. A Federa��o explicou que realiza desde 2009 �uma s�rie de a��es de fomento � pesquisa, de capacita��es, al�m de eventos informativos�.
�Entre essas iniciativas, destacamos o curso �controle de mosca de est�bulo�, que desenvolvido pelo Senar/MS, visa auxiliar o produtor com t�cnicas de manejo com objetivo de minimizar o problema. As a��es desenvolvidas pela institui��o, al�m do curso citado, inclui a elabora��o de folder informativo, de cartilhas, participa��es em audi�ncias p�blicas, visitas a campo, entre outros�, declarou.
A Semagro (Secretaria estadual de meio ambiente, desenvolvimento econ�mico, produ��o e agricultura familiar) foi questionada, mas at� a conclus�o da reportagem, n�o respondeu.
Outro lado
A Odebrecht tem 3 Usinas em Mato Grosso do Sul. Al�m da unidade de Nova Alvorada do Sul, o complexo agroindustrial est� presente em Rio Brilhante (unidade Eldorado) e Costa Rica (unidade com mesmo nome da cidade).
De acordo com o governador do Estado, Reinaldo Azambuja (PSDB), a empresa possui mais de R$ 50 milh�es em benef�cios fiscais.
Por meio da assessoria de imprensa, a empresa declarou �seguir integralmente todas as normas recomendadas pelos �rg�os t�cnicos competentes e as legisla��es ambientais vigentes no Estado de Mato Grosso do Sul sobre aplica��o de vinha�a�.
�Desde 2012, a Unidade Santa Luzia tem um programa estruturado de controle e monitoramento da mosca dos est�bulos. Uma equipe multidisciplinar conta com equipamentos adequados (armadilhas reflexivas, inseticidas e bandeiras para controle do inseto) e realiza visitas frequentes e assist�ncia aos produtores rurais da regi�o.A empresa ressalta ainda que participa ativamente de todas as discuss�es sobre a quest�o da mosca do est�bulo, junto �s autoridades locais, Embrapa, Biosul e produtores da regi�o�, esclareceu.
Izabela Sanchez | Foto: Divulga��o/Odebrecht